Dia sombrio, fríissimo, chuvoso e começando à nevar. Abri um armário que se encontra no KGB e aonde estão arquivados grande parte do meu material video, algumas cassetes estão lá aposentadas depois de anos. Encontrei de tudo, e passei parte do dia visionando algumas cassetes já esquecidas. Em 1996 fiz um video de 6 minutos, Le Chant de la Sibylle, cujo som é do Kronos Quartet. Na época, quando tive a idéia de escrever-lhes p/ pedir autorização p/ usar o material, um eco de opiniões divergentes se faziam ouvir no horizonte: diziam-me que uma artista literalmente desconhecida pelo grupo não poderia obter facilmente tal autorização. Mas eu consegui! -a carta encontra-se nos meus arquivos e eu já tinha me esquecido desta estória.- P/ entender o drama que se passava naquela época em relação à este projeto, basta dizer que a música não era finalmente um fundo sonoro pois eu estava terrivelmente inspirada por ela; o tratamento das imagens assim que a montagem foram tratados como um acompanhamento. Os textos foram tirados do La Jeune Parque, de Paul Valèry. Em resumo, se eu não tivesse tido a autorização, teria simplesmente que encostar o video.
Então, foi nesta situação de encantamento e curiosidade que eu redescobri o The Navigator, de Vincent Ward no meu armário. A cassete estava lá, empoeirada, atrás da Maison de Redressement, de Francisco Ruiz de Infante. Um e outro foram trabalhos inesquecíveis p/ mim. Eu tinha colocado estes dois documentos com dois outros cassetes, entrevistas com Paul Auster e Elisabeth Badinter. Visionei um pouco cada uma das cassetes mas infelizmente elas tinham sofrido bastante com o frio do local. O material ficou danificado -imagino que tenha sido o frio e a mudança de temperatura radical-. Mas foi o suficiente p/ eu me certificar do imenso talento de Vincent Ward nesta inesquecível odisséia medieval, como ele mesmo entitulou este seu trabalho.
O Navegador, o filme que colocou Vincent Ward entre os cineastas mais inovadores e competentes deste século, é um filme sobre os sonhos, a morte, as relações interpessoais, a força do coração humano e também sobre a procura por uma espécie de transcendência. O filme fala igualmente sobre a percepção da finitude e da complexidade do universo que nos rodeia.
Enfim, conto místico contemporâneo que se passa no século 14 durante a devastação da peste negra, o filme é uma das obras mais alucinantes já filmadas; a história é uma aventura aonde misturam-se fé, ciência, religião, misticismo, realismo histórico e aventura moderna, criando uma obra visualmente deslumbrante, sem aqueles efeitos especiais gênero gadget que eu tanto detesto; Ward trabalha com contrastes : a fotografia em preto e branco carrega oposições de sombras e paisagens cobertas de neve, o céu cinzento e a luz fantasmagórica de lampiões que queimam em cavernas obscuras. Expressionista, o filme é em realidade uma parábola sobre o ser humano na tentativa de compreender tanto seu universo imediato, como o universo infinito no qual vivemos subjulgados à forças complexas, assim que os possíveis universos paralelos à nossa própria realidade.
O Navegador, o filme que colocou Vincent Ward entre os cineastas mais inovadores e competentes deste século, é um filme sobre os sonhos, a morte, as relações interpessoais, a força do coração humano e também sobre a procura por uma espécie de transcendência. O filme fala igualmente sobre a percepção da finitude e da complexidade do universo que nos rodeia.
Enfim, conto místico contemporâneo que se passa no século 14 durante a devastação da peste negra, o filme é uma das obras mais alucinantes já filmadas; a história é uma aventura aonde misturam-se fé, ciência, religião, misticismo, realismo histórico e aventura moderna, criando uma obra visualmente deslumbrante, sem aqueles efeitos especiais gênero gadget que eu tanto detesto; Ward trabalha com contrastes : a fotografia em preto e branco carrega oposições de sombras e paisagens cobertas de neve, o céu cinzento e a luz fantasmagórica de lampiões que queimam em cavernas obscuras. Expressionista, o filme é em realidade uma parábola sobre o ser humano na tentativa de compreender tanto seu universo imediato, como o universo infinito no qual vivemos subjulgados à forças complexas, assim que os possíveis universos paralelos à nossa própria realidade.
O dia à dia áustero, em preto e branco, do povoado do personagem medieval Griffin contrasta com suas alucinações coloridas de um outro mundo no qual ele visiona a esperança de uma salvação contra a peste negra; suas visões quebram esta austeridade e aprofundam a narrativa em cavernas subterrâneas que se aparentam simbolicamente às profundezas humanas, e através das quais os pelegrinos do povoado alcançam um universo moderno e imcompreensível p/ suas mentes medievais que, portanto, cultivam ainda a fé, único motor catalisador de esperança.
Assim como Einstein, a estória nos diz que tudo é relativo.